terça-feira, 17 de maio de 2011

Artigo: Educação Prêt-à-Porter


Este artigo fala sobre visita que fiz ao Centro Nacional de Educação à Distância em Poitier, na França. Foi originalmente publicado na Revista Conect@, porém o site da revista não está mais no ar, assim, reproduzo o artigo na íntegra neste espaço, devido ao grande número de citações que ele obteve ao longo dos últimos 13 anos.





O modelo de educação francês foi largamente adotado ao redor do mundo e ainda é usado em grande parte das instituições de ensino. O modo como dividimos o conteúdo em disciplinas, na quase totalidade das universidades brasileiras, ainda segue exatamente a mesma cartilha proposta há séculos.

Porque é velho, não quer dizer que seja ruim. Muito pelo contrário. Se um modelo persiste, é porque tem virtudes que ainda não foram superadas, mas...

O próprio modelo francês está se modificando na origem e dentro em breve não poderemos dar este nome ao modelo adotado atualmente no Brasil, pois estaríamos cometendo uma grave injustiça.

Minha constatação é proveniente de uma visita feita ao CNED - Centre National d'Enseignement à Distance - que tem sua sede na cidade de Poitiers, no sudoeste da França. Lá, fui recebido por Jean-Pierre Tissanié (Directeur du Télé-Accueil). Minha visita tinha como objetivo conhecer a realidade européia na educação a distância e trago muito boas impressões do que vi.



Está surgindo um novo modelo, que pode não representar uma revolução pedagógica, mas com certeza representa uma revolução tecnológica. A educação a distância está obrigando as instituições de ensino a rever a prática pedagógica e o ensino tradicional está herdando benefícios que já deveriam ter sido incorporados há algum tempo.

Tome como exemplo os Estados Unidos: a educação a distância tomou conta das prateleiras da WEB. Lá você pode fazer a sua escolha dentre uma variedade enorme de cursos "plug-and-play". Você escolhe o curso na prateleira, dá o número de seu cartão de crédito e pronto...

A França também tem o seu modelo de educação "prêt-à-porter", só que no CNED este modelo vem sendo desenvolvido desde 1939 e o que é melhor, com o apoio político e financeiro do governo francês. A instituição possui atualmente 400.000 alunos estudando a distância em toda a França e nas ex-colônias francesas. É mantida parcialmente pelo Ministério da Educação francês e por mensalidades pagas pelos alunos. São oferecidos cursos desde a alfabetização até mestrado e Ph.D. São cerca de 3.500 opções diferentes e, dentre elas há até cursos de língua portuguesa.

Há mais de 60 anos, a instituição foi criada para oferecer cursos por correspondência e está passando por uma profunda reformulação tecnológica, devido ao aumento da demanda nos últimos cinco anos e da necessidade de se oferecer novos recursos de mídia digitais para comunicação e educação.

No dia 11 de outubro, quando estive lá, o CNED estava sendo visitado por uma delegação de professores chineses, que estão aprendendo a usar este novo modelo francês de educação para levar o conhecimento aos seus mais de um bilhão de alunos.

Além de permitir que o currículo tradicional ultrapasse fronteiras geográficas antes intransponíveis, o CNED tem seu foco na educação continuada e na reciclagem de profissionais, que não podem abandonar seus afazeres para voltar ao banco da escola. Há ainda os cursos de verão, a cada dia mais procurados, pois permitem ao aluno da rede convencional de ensino suprir as carências que porventura possam ter em suas escolas, fazendo programas de verão, com duração de um mês e a custos bem reduzidos. Estes cursos também são solução para quem quer se preparar para concursos públicos e provas específicas.

O valor a ser pago pelo aluno é subsidiado pelo Ministério da Educação e, logicamente, o valor se eleva conforme o nível de graduação. Também dependendo do grau, aumenta o nível de interação e o número de mídias envolvidas. Atualmente são usadas: fitas e CDs de áudio e vídeo, telefone, e-mail, CD-ROM, teleconferência, videoconferência, cursos baseados em páginas WEB, bate-papos e três recursos muito interessantes:

- Minitel - aparelho de baixo custo lançado em 1982, que é uma exclusividade francesa e permitiu ao povo francês se conectar a serviços de informações muito antes da Internet se abrir comercialmente. Apesar de ser acusado de causador do atraso da entrada da França na Internet, o Minitel teve o positivo papel de ambientar a população francesa com serviços on-line, muito antes dos americanos, asiáticos e seus vizinhos europeus.

- O CNED possui atualmente parceria com 56 instituições de ensino superior distribuídas por todo o território Francês, onde os alunos recebem tutoria, marcam reuniões de grupos de interesses, usam laboratórios e bibliotecas, etc.

- TV Interativa (ETI - Émissions de Télévision Interactives). Desde 1998 a aplicação deste recurso vem sendo testada em programas educacionais e os relatórios de feedback dos alunos vêm demonstrando um gradual aumento de satisfação com a tecnologia. Este recurso ainda não foi testado no Brasil, mas promete abrir novas portas para a entrada da educação a distância em lares onde não haja um PC.

Que a educação clássica passa por profundas transformações, a reboque da revolução da tecnologia da informação, não é novidade para ninguém. O que o Ministério da Educação francês vem fazendo é acompanhar esta transformação, oferecendo à comunidade francofônica a possibilidade de estudar "anytime and anywhere" e com toda a qualidade que se espera de uma escola francesa de alto nível.

Enquanto isso, no Brasil...

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